domingo, junho 29, 2008

a eficácia das rimas















A rima funciona como a manifestação da posse de um segredo cabalístico que permite, por especialidade de alguns eleitos, privar com certos mistérios. É o que parece acontecer com a quintilha transcrita, numa atitude inovadora por sair do molde da habitual quadra.
A poesia, enquanto revelação, propagou-se com bordões e rimas, desde o tempo das frases feitas na oralidade. E também porque era mais fácil difundir histórias, pensamentos e estados de alma através delas, se fossem memorizadas através do ritmo, que tem necessariamente a ver com o corpo - a primeira realidade imediata. Aedos e trovadores tinham a tarefa faciciltada.
O verso branco tornar-se-á ainda mais branco, quando os suportes de fixação linguísticas se adpataram à tecnologia, de Gutemberg a Bill Gates.
Por isso volto a este tema, tentando perceber a vontade de difundir o segredo da circulação em tubos - fenómeno que tanto alimentou este blog, sobretudo nos primórdios.

sábado, junho 28, 2008

o funcionamento dos marcadores


Já algumas vezes coloquei aqui "posts" sobre separadores. Agora seguem-se marcadores. Dão muito jeito porque marcam a página onde se vai na leitura ou assinalam a localização de alguma passagem que se queira ter em conta.

Eu tenho muitos marcadores, mas, geralmente, para marcar a página de um livro, uso outros objectos - um lápis, um bocado de papel, um cigarrro, um cotonete, uma tira de papel higiénico, a folha de uma planta do vaso, uma borboleta seca... em casos extremos dobro um cantinho da página, mas isso é raro. É que os meus muitos marcadres nunca estão no sítio certo. Além disso, quando compro um livro com oferta de marcador, separo logo o dito, não sei porquê, se calhar para a colecção dispersa pela casa.


Este marcador, aqui na imagem, é do livro Efeito Borboleta e outras histórias, de José Mário Silva. Funciona para chamadas de atenção no conto que acabei de ler, nunca para o conto que estou a ler, porque não dá para parar a meio de um conto, ou outra narrativa deste livro, já que as very short stories não se podem partir, têm de ser tiradas uma a uma desta espécie de short store.


Vejamos um exemplo:


Pesca à Linha


«Antigamente era tudo mais simples. Eu chegava-me ao rochedo, saltava para aquela ponta exuta que nem a mais traiçoeira das ondas consegue atingir, pousava o saco e o farnel e o balde com isco, ...»


Eu não posso dizer vou em isco, depois continuo. Mas uma pessoa pode mesmo ficar agarrada ao isco, ou seja, presa ao livro, como é o caso.


O mesmo se passa na última narrativa do livro, com o título


O que está no meio não interessa


«Era uma vez e foram felizes para sempre»


Admirável esta capacidade de José Mário Silva de lidar com o essencial, as coisas "inúteis" foram cortadas. Inutilia truncat, alguma voz lhe diz, o que vem de encontro a pensamentos e gestos que também partilho e já viram a luz neste funcionamento de certas coisas.



quarta-feira, junho 25, 2008

para evitar o mau jeito



Passo a citar:
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(Esta passagem vem na secção de adultos do D-Mail)

As fêmeas dos mosquitos







é melhor clicar na imagem para se ler bem













O problema está em encontrar as fêmeas, pois, a olho nu, confundem-se muito com os machos. Resolvido este pequeno problema, há, pela certa, grande mortandade. Para nosso descanso.


PS - O título do post é as fêmeas dos mosquitos. Se houvesse um mata machos, certamente que escolheria os machos das melgas

funcionamento do D-mail

O D-mail adapta-se muito bem a este blog. E nem sequer preciso de escrever exaustivamente sobre o funcionamento dos objectos que lá encontramos. Tudo com o mesmo pretexto: tornar a vida mais fácil. Escolhi alguns objectos, e irei escolher outros, mesmo que este funcionamento corra o risco de se constituir filial da empresa











(clicar nas imagens para se ler alguma coisa)





















Temos de concordar que, de facto, uma lanterna destas dá jeito. Repare-se na força da legenda: Para carregá-la, basta agitar!
E dá uma sensansação de vitória esta poupança de energia, nos tempos que correm.

segunda-feira, junho 02, 2008

Yves Saint Laurent















Yves Saint Laurent, forever


As luzes se fecharam, como outras portas
em certíssimas noites de Paris,
Claudia Shiffer e a tantas outras
já sem o nome que vem dele,
um gesto quase negro, Naomi
passando a seda, o cetim de Campbel

(são pintores que lanças em Matisse
de roupa desenhada junto à pele
na transparência da música, roxos acessórios
do estilo, o traço idêntico abrindo o corpo a quem disse
é quase o fim da moda, antemanhã)

Mais do que uma cor é o manequim
que no modelo transportado o seio aberto leva
a ti, a ele, a outros, Yves Saint Laurent
no fundo do manto rosa que dizem ser forever.

É a dita beleza sublime do padrão ocidental
etnia multiplicada sobre a pele
renda preta sempre de ti na passerelle,
imitando o próprio traje no perfume global.

E uma voz canta em fundo: summertime...
não importa a estação do ano, a primavera-verão
maculada em minha noite onde filtro o encanto da soprano
comovendo a medo Yves Saint Laurent.

A elegância deixa ver o rosto, a maquillage
no atelier de altíssima costura,
tudo se fez preto, excepto os lábios
vermelhos, tão vermelhos na postura,
cabeças loiras ou rapadas a sorrir azul.

Que resistência esta de lutar e de existir
como concerto em Sarajevo, mesmo assim,
marcada a roupa, o trapo-arte na efémera atitude,
quando tudo pode viajar além do sangue, além da guerra
quando o braço direito paralisa o criador em cena
e se abandona ao cântico que Deneuve encerra!

inédito, 2002