domingo, junho 25, 2006

Vick ou Vicks?

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Vicks VapoRub

Cintilava nos olhos uma ardência
e a obscuridade percorria-lhe o corpo afagado no calor
pesado e húmido,

este sonho abraçava-lhe a alma
uma lembrança tornava ainda mais vivos os dias
presos a uma cama amolecida
pela infância primeira e primitiva.

Não era a transparência que desejava,
como daquela vez em que mergulhou no rio,
água até quase à cintura, talvez,
não se sabia exactamente,
ali descia uma cascata de espuma pela tarde,
um afago na garganta quase a tocar-lhe a boca,

mas no sonho ele adivinha a serenidade
«Como vais aparecer ao fim da sede, nesta hora
ressequida pela febre?»

Não era aquela febre intensa,
apenas uma temperatura mais alta que o normal
feita de pequeninos traços sobre um fio de mercúrio,
quase trinta e sete e quatro, ou e cinco, tanto vale.

Assim permanecia naquela alucinação da gripe,
«foi um resfriado que apanhaste,
corrente de ar que te atravessou o peito, as costas...»
e as suas mãos eram ásperas,
encolhia-se na cama como se estivesse a nascer
«um chá de limão bem quente, gostas?»

Quem lhe moldava o peito em Vicks VapoRub
esse creme intenso, amaciando infâncias
constipadas de xaropes?

«Foi mas é das correrias, do suor
que lhe ficou no corpo irreverente»,
é o tio a falar, em visita casual.

«Mais uns dias de cama? Talvez seja melhor...»,
é a prima a falar, ajeitando o lençol.
E ele, cansado, avesso mesmo ao leite quente.

«Não te chegues para ele, olha que se pega»
é a mãe que se aproxima, num falar macio
como o mel que lhe traz, de rosmaninho.

Acordo eu também a tempo de contágio,
vendo o meu irmão dormindo, agarrado ao corpo mole,
de agri-doce suportado na tontura
do Vicks VapoRub,
ainda quente e frio, a intensidade verde engole
sem sentir a traqueia, a faringite, um arrepio,
a boca sabe-lhe a calor de mãe e a mentol.


E a ardência que vai da testa aos olhos,
nesta eternidade que arde e cura?
Vem logo a seguir, na lembrança do sol,
do banho na água fria encoberta por amoras,
e por um ramo de salgueiro, que descia...
Só no cheiro a Vicks esse tempo ainda perdura.

AFerra, inédito, 2004

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Nota; existem as duas versões: Vicks e Vick








1 Comentários:

Às 12:30 AM , Blogger tsiwari disse...

as famílias tão diferentes...os familiares tão iguais!


ab_R_aço (é para ser forte! apertado!)

 

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